quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

Da Série "O Sangue Derramado": OS VIVOS NÃO MORREM ONDE OS MORTOS NÃO VIVEM - PARTE 001 E 002

PARTE 001

            Em meio à razão da noite, um pastor-belga se materializava, graças à distante luz da lâmpada de vapor de sódio de um poste. Que era refletida por seu lustroso pelo, pelos enigmáticos olhos e repousava na fumaça em que, em função do forte frio, sua respiração se transmutava. Enquanto observava um cidadão que, junto ao tal poste, fumava.
           
            - Você não me disse que era tabagista – comentou uma moça pálida que, com uma bolsa pendurada no ombro, do tal sujeito se aproximou. Uma mulher que aparentava ter acabado de sair da adolescência. E se distinguia por possuir lábios carnudos e pintados de preto, grandes olhos azuis, que eram “exotizados” por uma maquiagem em estilo egípcio, e por ostentar um penteado em modelo colmeia, que, devido à sua pouca idade, levava a deduzir que era mais inspirado em Amy Winehouse do que em Elvira, a Rainha das Trevas.
            - Quer uma cigarrilha Zino, Beatriz? – ele perguntou, ao notar que, em decorrência do decréscimo de distância, dois “piercings” de ouro branco destoavam do rosto da criatura. Um captive, no lábio inferior, e um barbell, na sobrancelha. Consequentemente, também inferindo que o descoramento da cuja era causado por um problema de circulação sanguínea. Já que a roupa de couro preto, que ela usava, era tão apertada que a fazia, aparentemente, ter mais massa do que sua pouca carne, em outra circunstância, daria a entender.
            - Mais tarde, Emeric. Bem mais tarde. Se valer a pena – Beatriz respondeu, sem se concentrar no discurso. Visto que se deslumbrava com o comprimento exacerbado do rabo-de-cavalo dele.
            - Valerá – Emeric “contra-argumentou”, sem perder um detalhe da cuja. Como as pontas de uma tatuagem que lhe subia pelo pescoço.
            Todavia, em acordo com uma proposta preestabelecida, e aprovada por ela, dele – que tinha o propósito de poupá-los de algum possível acanhamento –, o duo perpetrou seu primeiro contato por meio de um breve ósculo; em que se tocaram com o canto de suas bocas.
            - Você é mais bonito do que eu esperava – Beatriz observou, ao se encantar com a doce malignidade que as espessas sobrancelhas outorgavam às vistas do cujo. Em que as íris sustentavam um tom achocolatado tão intenso que, por vezes, resvalava em uma pigmentação avermelhada. E concluiu: - Inclusive, suas fotos se parecem com pinturas.
            - É um truque.
            - Truque?
            - Espalham-se algumas pinturas hiper-realistas pela internet; para, na hora do “vamos ver”, surpreender.
            - Tem mais algumas surpresas aí?
            - Algumas.
            - O que é isso? – ela perguntou, ao se intrigar com a sacola cinza que ele carregava. Que, em função da iluminação pública, às vezes, adquiria uma tonalidade esverdeada.
            - Um macio colchonete.
            - Você sempre pensa em tudo?
            - O demônio se esconde nos detalhes.
           
PARTE 002

            Enquanto várias nuvens sombrias vagavam pelo céu, o duo caminhou no curso de seu almejado destino. Que era discriminado por um letreiro arqueado e em neon azul em que se lia: “Cemitério Municipal de Arcádia Paulista”.
           
            - Me espera, aqui – pediu Emeric.
            - Não demora – Beatriz consentiu, ao seu modo, ficando à beira de uma larga calçada.
           
            Sem mais, ele tomou o rumo da entrada do cemitério. Chamando a atenção de um elemento alto, magro e que se trajava como um policial. Só que sem ter a posse de um distintivo. E que, por trás das desgastadas grades de um grande portão, ajeitou seu quepe e testou a lanterna.
            - Boa noite – saudou Emeric.
            - Boa noite – respondeu o desconfiado, porém morigerado, vigia.
            - Muito movimento, hoje?
            - Depende... Aqui, dentro, ou aí, fora?
            - Como dizem: “Os vivos não morrem onde os mortos não vivem”.
            - Em que eu posso te ajudar?
            - Qual é o seu nome?
            - Severino.
            - Severino, eu me chamo Kretzulesco, Emeric.
            - Kret...
            - Emeric.
            - Pois não, Emeric...
            - Está vendo aquela “gata”? – e, com uma leve oscilação da cabeça, acenou em direção a Beatriz.
            - Caprichada.
            - Até demais. E por conta disso, ela só quer transar comigo, se for dentro de um cemitério.
            - Que “barra”!
            - Ela nunca transou em um... E uma mulher deste “naipe” não se encontra por aí.
            - Olha, amigão... Se dependesse de mim, você poderia transformar esse lugar em um bordel. Mas se te pegam no flagra, eu vou ter que pedir esmola.
            - Não há alguém, aqui, que represente uma ameaça ao seu ofício, Severino. Fazendo com que a condição de “tolerável”, ou não, seja uma tarefa meramente interpretativa. Assim, as competências em que se incluem a missão de manter a louça lavada, os quadros alinhados com o horizonte e o gato nutrido são parte de um ônus exclusivamente seu.
            - Por isso, creio que você concorda com o meu receio em abrir a porta de casa a um desconhecido. O mínimo que pode acontecer, é o gato escapar.
            - Quanto a isso, não há discussão, Severino. E como raciocinamos na mesma frequência, eu sei que você está se vendo, como eu estou me vendo, diante do inusitado. O que não ocorre comumente. Mas que nos dá, assim, a chance de ter mais uma história para contar.
            - Realmente, não é algo corriqueiro.
            - E tem mais, Severino: você tem de fazer a ronda por todo o perímetro, durante essa gélida, porém bela, noite. Entretanto, há mais hectares de solo santo do que você tem de “perna” para caminhar. Logo, empatamos. Você se ocupa com uma parte da diligência; e nós damos fim à outra. Afinal, qual é o indivíduo que, na calada da noite, terá coragem de enfrentar duas entidades que gemem euforicamente, em meio a um cemitério.
            - Vocês vão fazer muito barulho?
            - Nada que atormente o sono dos mortos.
            - Isso não é blasfêmia?
            - Severino, o ato não se estende para além da consumação do fato. E por isso, o desejo é apenas o início de um fim. Logo, não há regresso. Tudo o que tinha de ser feito já está em movimento. E nós só estamos no meio do caminho.
            - Então você me transformou em um pecador?
            - Vamos alçar a situação ao seguinte patamar, Severino: você opta por não nos ver entrando e, consequentemente, não nos verá saindo. Por fim, nada terá acontecido.
            Todavia, sem conseguir se livrar do forte fitar de Emeric, Severino sentiu o peso da chave do portão aumentar. E, antes que o bolso da sua calça cedesse, disse:
            - Tá bom. Seja rápido – então, sacou um molho de chaves, que estava atrelado a um chaveiro enferrujado em forma de caixão, do bolso, escolheu a certa e, meio a um festival de ruídos metálicos, colocou-a em ação.
           










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